A menina e a moeda



Entre o café e o pão,  o queijo e a goiabada,   ela e ele falavam sobre o romantismo de nossos dias. 

Homens e mulheres independentes e  decididos com os rumos de suas vidas, mas vacilantes com seus amores. De que são feitos os castelos de príncipes e princesas que dão conta de suas vidas sem a espera do dia encantado? Ou este  dia  anda tão encantado - e distante -  em função  da exigência sem fim  que os  atos solitários  produzem?

E vai ficando para trás o acaso, a  boa dose  de poesia,  estrelas cadentes,  pequenas e inesperadas delicadezas. O   castelo da razão  torna  a  espontaneidade da entrega uma   muralha  do que deve ser.  Entre palavras que explicam,   o alegre  movimento  de uma  criança solicita atenção.


A pequena menina brincava.
Passava entre os móveis e  descobria em cada passo uma invenção do espaço.
A cadeira virava escada.
A mesa uma casa.
O sofá uma piscina para mergulhar entre  almofadas.
E no próximo passo preferiu pescar.
Dali avistava o mar e seus movimentos para fazer o olhar passear.
Mas a menina escolheu o rio  feito das águas  escuras do chão que pisava.   
Para  pescar tinha a extensão do braço e seus pequeninos dedos.
E logo avistou seu peixe.
Na   alegria deste   encontro seu olhar buscou companhia  para contar sua façanha.
Com a mão dando contorno ao seu tesouro sua voz pousou no olhar da princesa:
Olha o que eu achei!
A  voz entusiasmada  era   vagarosa, pois  ainda decifrava o mapa das palavras.
Em sua  mão brilhava  o "peixe", uma moeda.

Seguindo o  entusiasmo da menina,  a princesa  indaga o que ela fará com seu tesouro.
A pequena vacila para responder, pois não estava no percurso das trocas do reinado. 
Ela habitava  os passos dos  sentidos.
No instante de vacilo, o príncipe e  a princesa andaram pelas mil possibilidades  que o reino oferecia para adquirir algo de  valor àquela menina de olhos brilhantes.  
O pensamento consultou  o mago, os mestres de ofício, as artesãs. 
Teriam algo  que correspondesse ao encontro de tal preciosidade?
Depois do suspense, a menina  diz soletrando  o que a moeda iria comprar.
O reino da razão sucumbiu. 
Ficou o sorriso e a sensação de que  o acaso trouxe um castelo de algodão doce para os sobreviventes do reino degustarem.    
Qual era o nome e o gosto da moeda soletrada?  “PI-PO-CA!”.

P.S. 
Finalizo este texto entre trajetos de uma viagem. Ao sentar em meu assento a pessoa ao lado parece incomodada. Depois de revirar-se resolve perguntar se posso mudar de lugar para que ela sentasse ao lado do namorado. Eu jamais seria a muralha a distanciar namorados por infinitos 45 minutos. Gostei de ser a moeda desta PI-PO-CA :)


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